O Desporto Rei
Em Portugal o desporto é algo muito importante no país. Mas de todos os desportos praticados há um que se destaca. O futebol, desde há muito o desporto rei. O futebol é um desporto de massas, visto por milhões em todo o mundo. É a verdadeira paixão de muitas pessoas. É para muitos mais que apenas um jogo. É um modo de vida, algo com o qual não conseguem viver. É impensável para muitas pessoas viver num mundo sem futebol. Num mundo sem Ronaldo e Messi ou sem as ligas de toda a europa. É tradição para muitos no dia 26 de dezembro assistir ao Boxing Day da Premier League, ou ver religiosamente todos os jogos do Europeu ou do Mundial. O futebol é um fenómeno, que para quem não sente o mesmo, extremamente difícil de explicar. E é fácil de perceber porquê. Como é que se pode explicar a alguém que não sente um amor “cego” por um clube de futebol que existem pessoas neste mundo capazes de viajar mais de 1000Km e gastar centenas de euros apenas para durante 90 minutos verem 22 homens a “jogar à bola”. Obviamente que para quem faz estes quilómetros todos, não são apenas 22 homens “a jogar à bola”, é muito mais que isso é uma extensão deles mesmos é como grande parte da sua personalidade estivesse representada nas cores do seu clube. E que por isso mesmo, estes indivíduos são capazes das maiores loucuras pelo seu clube.
Voltando às tradições, desta vez mais concentradas no nosso país, quem nunca foi a uma final da taça no Jamor? Quem já foi sabe que a tradição é fazer um churrasco na mata em volta do estádio, é beber e convidar o vizinho para a nossa mesa, seja ele do nosso clube ou não. Ou por exemplo quem nunca convidou a família e amigos para ver um jogo na seleção das quinas na sua casa.
O futebol para além de um negócio muito rentável é um desporto com centenas de anos que está cheio de tradições e lendas que irão sempre ser perpetuadas. Em Portugal dificilmente deixará de ser o desporto rei, o desporto do povo, e depois do golo do Éder na final do europeu de 2016 cada vez tenho mais certezas disso.
A Realidade do Futebol Distrital
Apesar disso umas das tradições que tínhamos em Portugal era o de ir aos jogos do clube da nossa terra, hoje em dia os miúdos deixaram de apoiar, por mais que não seja durante 90 minutos de 15 em 15 dias, os clubes das suas terras. E com isso o futebol distrital sofreu e muito. Deixou de haver aquela rotina, que era seguida quase religiosamente, que de 15 em 15 dias existia. Cada vez que o clube da nossa terra jogava o caminho para o estádio era feito a pé, o bilhete era comprado 20 minutos antes do jogo, e não havia pressa. Tudo era feito com calma, todos se conheciam, nem que fosse apenas dos jogos em casa. Grande parte das vezes o que menos importava era o resultado, ou se a equipa jogava bom futebol, o importante era a confraternização. Por muitos campos deste país fora o domingo era dia de futebol. Nem que fosse só para ir ao bar buscar uma imperial, comer uma bifana ou um courato. E para muitos o sítio onde se podia dizer umas asneiras sem que ninguém ligasse. O futebol distrital já fazia parte do quotidiano de uma cidade, vila ou aldeia de Portugal.
Infelizmente, com a cada vez maior cobertura televisiva dos grandes campeonatos, com a emissão quase diária dos jogos onde estão as grandes estrelas do futebol mundial. A população deixou de ir aos campos e estádios do sítio onde moram e optam cada vez mais por ficar em casa. São poucos os que ainda saem de casa ao domingo para apoiar o clube da sua terra, e os que ainda o fazem são na sua maioria pessoas mais idosas que mantem viva essa tradição. Esse é um dos grandes problemas estes clubes foram deixados ao abandono. Os jovens não se interessam nem querem ir ver um jogo que é quase sempre mal jogado. E muitas das vezes as pessoas mais velhas já não tem capacidade para tomar conta dos clubes e estes acabam por cair e muitos acabar.
Nem todos os clubes da distrital são assim é verdade mas que podemos falar em mais de 80% isso não tenho duvidas. Felizmente existem exemplos que mostram o contrário. Clubes que se viraram para o povo da terra e conseguem ter milhares a ver os seus jogos. Exemplos de sucesso como o Farense e o Sporting de Espinho, que nos dias de hoje já conseguiram chegar a outras divisões. Mas o exemplo dos dias de hoje é sem dúvida o de duas equipas da divisão distrital de Aveiro, o União de Lamas e o Lusitânia de Lourosa. Estas duas equipas conseguem ainda levar milhares de adeptos aos seus estádios. Como podemos ler nesta notícia do zerozero.pt “Se não foi estádio cheio, foi lá perto. Milhares e milhares de adeptos vizinhos, rivais e apaixonados” (https://www.zerozero.pt/news.php?id=209618).
Apesar disso esta não é a realidade na grande parte do futebol distrital em Portugal e nesta reportagem eu vou dar o exemplo daquele que já foi o maior clube da cidade de Almada, o Almada Atlético Clube. Depois de uma conversa com o treinador do Almada, Nuno Cirilo, foi possível perceber ainda melhor aquilo que é a realidade destes clubes.
Como é óbvio o grande problema para muitos clubes é o dinheiro. Que muitas das vezes é muito pouco ou nenhum. No caso do Almada, o treinado confessa que o clube não atravessa uma boa fase que por isso não consegue atrair bons jogadores nem motivar os que fazem parte do plantel. No dia da entrevista estavam presentes apenas 13 jogadores dos 26 que fazem parte do plantel, entre eles 2 guarda-redes. “Não passamos por uma realidade muito agradável, o clube não tem muitas condições. Neste momento não conseguimos atrair os melhores jogadores. Como não pagamos nada aos jogadores, isso faz com que eles não se sintam obrigados a aparecer aos treinos.”.
Nuno Cirilo revela a fonte dos problemas no clube. Antigas direções que agiram de má-fé e deixaram o clube à beira do fim “Um dos fatores que denegriu o nome do Almada foi fazer fiado e depois não pagar, vamos pedir um patrocínio a alguém que já patrocinou anteriormente e dizem logo que ao Almada nem pensar porque já foram enganados. A câmara apoiava o Almada. O clube dava orçamentos para obras ou inscrições de jogadores e o dinheiro desaparecia. Neste momento estamos a pagar pelos roubos dos que cá estiveram anteriormente”. Infelizmente este é um problema comum em muitos clubes por este país fora, pessoas que se aproveitam dos clubes para ganhar algum dinheiro e que depois desaparecem deixando os clubes num ponto quase sem retorno. É ai que a população que antes apoiava o clube se tende a afastar. Como também acontece no Almada “As pessoas que apoiavam o Almada, hoje apoiam o Piedade. Apesar de antes dizerem que o clube de coração era o Almada”. Para além disso há ainda a agravante de uma realidade bem conhecida do futebol português, que é o apoio quase exclusivo aos 3 grandes Porto, Benfica e Sporting “Era compatível ser do Benfica, mas vir aqui ao estádio apoiar o Almada. O bilhete para o Benfica custa no mínimo 10 euros enquanto aqui custa 2. Mas é mais fácil ficar em casa a ver os 3 grandes que vir aqui ver o Almada. E é diferente jogar para 300 pessoas ou para um estádio vazio. Alem disso isso estariam a ajudar o clube.”. Uma ajuda preciosa para que haver uma noção o clube tem muitos custos. Nuno dá-nos o exemplo de uma deslocação a um jogo fora de portas “Uma deslocação a Grândola custa à volta de 700 euros o que para um clube que anda a contar o dinheiro para pagar a eletricidade todos os meses é bastante.”. Numa altura em que o investimento estrangeiro no futebol português é mais elevado que nunca muitos clubes veem isso como uma salvação para todos os problemas, o treinador do Almada também via com bons olhos um investimento no clube “Um investidor era bom para relançar, um clube que já foi grande, a curto médio prazo.”.
Nuno fala da sua experiencia como jogador do Almada e revela que houve uma altura que o dinheiro no futebol abundava e que nesses tempos o apoio ao clube não faltava, mas hoje em dia o afastamento é geral principalmente dos mais jovens “Nessa altura vir ver o Almada era uma questão de gosto. Mas essas pessoas ou estão muito velhas ou já faleceram e a malta mais jovem, a juventude de Almada, não se identifica com o clube. Apanharam o clube numa má fase e preferem apoiar os clubes da zona que estão numa melhor fase.”. Tal como no Sporting de Espinho a estratégia da atual direção do Almada passa por tentar voltar a chamar as gentes de Almada para o clube tentar atrair mais jovens e o treinador tem uma palavra a dizer sobre isso “Para ser presidente de um clube não é preciso ser uma pessoa mais velha só é preciso ser competente. Não precisa de trazer dinheiro precisa de arranjar formas de conseguir dinheiro. É dentro da linha de pensamento do Espinho que queremos seguir.”.
Esta é a triste realidade do futebol português que é jogado longe dos holofotes, longe da glória ou das manchetes dos jornais. Esta é a realidade do futebol real, jogado por homens reais, que aos poucos vai desaparecendo.
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